Denise Accurso
Havia a dor e a sensação de sufocamento. O café passou a descer sem gosto, sem prazer algum. Havia raiva, também. Mas a dor dominava.
Seu marido acabara de receber a ligação que eles não queriam receber. Ele não precisou dizer nada. Bastou olhar.
Jogou os cabelos que, desgrenhados, caiam pra a frente. Tomou outro gole do café, agora frio. Nem se deu conta das lágrimas que rolavam, livres.
Pôs a louça suja dentro da pia, num gesto desprovido de sentido. Curvou-se, agarrando o próprio abdômen, dominada pela dor. Precisava haver um sentido, um significado. Mas não havia, apenas o nada que a sufocava. E a dor. E a raiva.
“Vamos conversar?” Ouviu a voz, amada até um minuto atrás. “Deixa eu te contar…” Aquela voz… Não mais a suportava. Aquela voz tornara-se odiosa. Não queria ouvir. Gritou, mas nenhum som saiu de sua garganta.
Saiu da cozinha. Ia embora. Deixaria a cidade. Ou não faria nada. Não conseguia saber como diminuir sua agonia.
Abriu a janela. Havia vento e frio. Recebeu-os no rosto. Aquele pesadelo nunca teria fim. Não havia nada para aliviar. Era uma ausência, um vazio brutal e eterno.
Sentiu que a puxavam pelo braço. Sacudiu-se livrou-se, saiu. Sem rumo. Sem escolha. Sem vida.
Sabia que não conseguiria voltar. Sabia que nunca o perdoaria. Afinal, eram os genes dele! A mesma doença dele, que, cruelmente, se manifestara de forma muito mais grave no filho. Ele era o culpado e devia ser castigado. Ela nunca mais o veria.
Seria esse castigo para ele ou para ela?