Denise Accurso
– Bom dia!
– Bom dia. Queres alguma coisa?
– Estou só dando uma olhadinha…
– Meu amigo, aqui no meu brique não tem nada pra olhar. Só pra vender. Se não vais comprar nada, podes ir embora!!!
… … …
– Boa tarde, seu João.
– Boa tarde… Tu não és o filho da Dona Lurdes?
– Sou eu mesmo, Seu João.
– Tudo bem com tua mãe?
– Tudo, graças a Deus. E com o senhor?
– Tudo bem. Vai querer alguma coisa ou veio só bater papo?
– Não… eu… queria saber o preço desse violão.
– Ah, tu quer saber o preço do violão? Já te digo, não é pro teu bico!
– Ai, que é isso, seu João?
– Ora se não te conheço e não sei que não é pro teu bico! Raspa daqui e não me faz perder tempo!
… … …
– Moço… Moço…
– Oi, pois não?
– Moço, eu sou do interior, vim no médico, estou esperando o ônibus naquela parada ali…
– Estou vendo. E daí?
– O ônibus está demorando muito, eu estou apertada… O senhor não me deixava usar seu banheiro?
– Não me faltava mais nada, virar banheiro de parada de ônibus. Negativo, minha senhora. Isso aqui é um brique, não um bar. Aqui não cedemos banheiro nenhum.
– Nem se eu comprar alguma coisa baratinha do senhor…
– Olha bem à sua volta, minha senhora. Aqui nada é baratinho! Tudo é usado, mas de alta qualidade. E não temos banheiro pra clientes. Pode esquecer!
… … …
– Seu João! Seu João!
– Que é que foi? Nem ler meu jornal em paz eu posso agora?
– A mãe pediu pra saber se tem algum sofá-cama e quanto é.
– Se ela quer comprar sofá-cama, porque não veio ela mesma e mandou uma criança? Hein? Reponde pra mim! Não faz essa cara. Não te ensinaram a falar com os mais velhos? Ah, agora vai chorar… Muito bem educadas essas crianças de hoje. Isso, sai correndo sem dar tchau nem nada. O mundo está perdido mesmo, ninguém educa esses fedelhos.
… … …
– Boa tarde.
– Boa tarde.
– Bonito esse casaco. É couro?
– Couro legítimo uruguaio. Alta qualidade.
– Posso experimentar?
– Pode. Deixa eu te alcançar.
– O senhor não tem um espelho?
– Pode te olhar nesse espelhinho aqui.
– Não dá pra ver direito. Não tem um espelho maior?
– É esse espelho aí mesmo. Se quiser é isso.
– Acho que não vou levar, afinal…
- Só veio me dar trabalho e me fazer perder tempo, né? Como todo mundo aqui.
… … …
– Oi, pai. Já vai fechar o brique? Ainda é cedo.
– Ai, meu filho, nem sei porque que ainda abro. Outro dia sem vender nada. Deve ser essa crise de que tanto falam.