Invasores


Denise Accurso

Eliane e Roberto estavam exaustos. Felizes, mas exaustos. Tinham conseguido passar quase dois meses viajando! Uma mistura de férias e home working permitira tal façanha.
Foram longas horas de aeroporto e avião, com os já costumeiros atrasos e muito nervosismo com a demora para o surgimento das bagagens na esteira. Finalmente, por volta de duas da manhã, desceram do táxi em frente ao prédio em que moravam. No dia seguinte teriam que trabalhar.
Foi um verdadeiro milagre caberem no elevador junto com as respectivas bagagens. Ambos estavam pálidos, com os olhos vidrados de cansaço.
Carregaram as malas pelo corredor tentando fazer o mínimo de barulho possível, pois não queriam incomodar os vizinhos.
Quando chegaram à porta do 1140, os dois começaram a tentar achar uma das chaves. A luz do corredor apagou-se e, com isso, o barulho do gerador cessou. Em meio ao silêncio da madrugada, ouviram um som saindo de dentro do seu apartamento.
Era horrível, uma espécie de chiado, como se alguém estivesse usando o aspirador de pó ou jogando video-game.
– Você está ouvindo isso? Vem de dentro da nossa casa!
– Schhh! Fala baixo! Claro que estou ouvindo. Parece que alguém invadiu nosso apartamento.
– Você achou a chave? Abre logo essa porta.
– Ficou maluca? Não sabemos quem está aí. E se forem criminosos e estiverem armados? Ouve, ouve.
Colaram os ouvidos à porta.
– Meu Deus! Você está sentindo esse cheiro?
– Est-tou… É… é horrível… parece… ai, meu Deus… parece cheiro de cadáver!
Eliane começa a chorar, tentando não fazer barulho.
– O que vamos fazer?
Roberto cola de novo o ouvido à porta.
– Esse barulho é estranho, parece que vem e vai… Bem parecido com o som de uma máquina de lavar.
– Esses bandidos… Será que mataram alguém e estão limpando tudo?
Os dois se olham, apavorados.
– Roberto… Estou com muito medo… alguma coisa horrível aconteceu ou está acontecendo na nossa casa! Que faremos?
Roberto leva os dedos aos lábios, pedindo silêncio. Pega Eliane pelo braço e, acenando com a cabeça, sugere que se afastem da porta.
Deixando as malas para trás, voltam ao elevador.
– Que faremos?
– Acho melhor ligar para a polícia.
Descem para a recepção do prédio. A polícia é chamada. Chegam dois policiais em uma viatura. Encontram o jovem casal de olhos arregalados, abraçados fortemente.
Após uma breve narrativa, os policiais resolvem subir.
– Vocês tem a chave?
Eliane entrega sua chave.
– Podemos subir com vocês?
– Melhor não. Não sabemos se haverá resistência. Aguardem aqui.
Os jovens, apavorados, concordam, com uma expressão de alívio.
Minutos depois, um dos policiais chama-os de dentro do elevador:
– Venham! Podem subir.
Os dois trocam olhares desconfiados.
– Mas o que houve? pergunta Roberto.
– É melhor que vocês mesmos vejam.
O olhar do policial revela um brilho divertido.
Os três chegam à porta do apartamento, que está fechada. O policial que lá ficou parece estar se limpando com um lenço. O mal cheiro piorou muito.
– Abram a porta e olhem.
Roberto se adianta e abre a porta.
Ouve um zumbido dos infernos e, em meio à escuridão, percebe o voo de milhares de insetos. O policial usa a lanterna.
– São moscas. Moscas varejeiras. Nunca vi tantas. E esse cheiro…
A luz da lanterna avança até a porta da geladeira. Do freezer superior, escorre um caldo escuro.
Roberto tenta acender a luz, aciona o interruptor. Nada acontece. Subitamente, percebe o que aconteceu.
– Eliane! Nós esquecemos de pagar a luz!!!

voltar

Denise Accurso

E-mail: deaccurso@gmail.com

Clique aqui para seguir esta escritora


Site desenvolvido pela Editora Metamorfose