Denise Accurso
Hoje é meu aniversário. Estou completando 51 anos. Quase ninguém sabe disso, pois não tenho Facebook e não fiz questão de contar pra ninguém. Não gosto de fazer aniversário, nunca gostei, e essa falta de gosto piora a cada ano que passa.
Pouca gente sabe dessa data e são essas poucas pessoas que me passam mensagens de felicitações. Não me desagradam essas mensagens, nada disso. O que não gosto é de fazer um grande evento, chamar a atenção, ser obrigada a receber pessoas, ou ir a algum lugar com convidados. Prefiro que ninguém saiba.
Além disso, a cada ano que passa menos desejo marcar esse decorrer. Não aceito ser rotulada por conta dos anos que vivi. Tampouco pretendo me encaixar em perfis de “mulheres acima de cinquenta” ou coisa que o valha.
Quero me dar de presente um dia perfeito, discreto, fazendo coisas que me deixam feliz. Levantei tarde, estou terminando de me arrumar e logo vou a um bistrô que adoro para almoçar. Estou mais arrumada que de costume, inclusive maquiada.
O bistrô está com metade das mesas ocupadas. Escolho uma e peço meu almoço, depois de cumprimentar a proprietária, que fica no caixa e me conhece como frequentadora mais ou menos assídua.
Pago meu almoço. A moça do caixa sorri e me deseja um bom dia. Estou no segundo degrau em direção à rua quando ela me chama:
– Catarina. Catarina, só um instante!
Viro-me sorrindo. Imagino que tenha visto no meu cadastro ou coisa que o valha que dia é hoje.
– Esqueceste teu cartão!
Ela me estende o retângulo de plástico e já está olhando para o outro cliente que se aproxima para fazer seu pagamento. Essa foi por pouco!
Olho a hora e vejo que posso ir a pé tranquilamente para meu próximo compromisso. Marquei uma leitura de tarô com a Virgínia, ela joga pra mim há anos. Vou adorar estar com ela e ouvir o que o baralho me disser.
Chego com cinco minutos de folga. Virgínia me recebe com aquele sorrisão e um chazinho de jasmim que adoro. Sei que ela provavelmente vai lembrar que hoje é meu aniversário, mas não me importo, na verdade quase quero isso, um abraço de aniversário dessa pessoa tão querida e iluminada.
Jogamos. Ela vê várias coisas interessantes, me diz pra procurar minha gineco e outros conselhos. Aí, pergunta:
– Tem alguma coisa que tu queiras saber? Queres tirar alguma dúvida?
– Ai, sei lá, Virgínia. Diz alguma coisa sobre o dia de hoje!
Ela embaralha as cartas. Eu corto e corto de novo, ela abre algumas, aponta, explica.
– Em resumo. O que vejo pra hoje é mudança. Pode ser alguma notícia… mas parece que não. É alguma coisa interna. Uma mudança tua mesmo. É o que as cartas estão mostrando aqui, ó.
Ela me explica algumas coisas mas não retenho nada. Estou meio decepcionada por ela não lembrar do meu aniversário… Parece que isso teria que estar ali, no tarô. Mas não está.
Enfim… despeço-me dela com um abraço carinhoso. A consulta, que deveria durar uma hora, levou quase duas.
Saio de lá pensando no que fazer a seguir. Ir ao shopping? À cafeteria? Talvez ao cinema? Nada disso parece ser o que eu quero. Por fim, entendo melhor a resposta do tarô. Acesso o grupo de whats dos amigos e posto: “Pessoal! Hoje é meu aniversário e quero muito festejar com vocês! Quem puder, passa lá em casa e leva sua bebida. Espero todos. Gratidão!”
Repito a mensagem em alguns outros grupos e passo numa confeitaria a caminho de casa pra comprar salgadinhos. Sinto-me muito feliz.