Denise Accurso
Será que o raio cai duas vezes no mesmo lugar?
Não vim falar de raio, mas de abelhas.
Entre abril e maio deste ano, passamos um mês em Mendoza. Somos consumidores vorazes de mel, que usamos no lugar de açúcar, e erramos no cálculo da quantidade que iríamos precisar.
Não queríamos comprar um produto qualquer, então pedimos ajuda a amigos que residem em Mendoza, que nos apresentaram ao Sr. Juricich, que só não fazia chover: em sua encantadora propriedade, faz azeite de oliva (excelente), vinho, doces de frutas e coisas que não chegamos a conhecer.
Como queríamos mel, ele nos levou para conhecer as produtoras. Sem nenhum equipamento de segurança, mexia nas colmeias e roubava o alimento das abelhinhas, enquanto nos explicava que as abelhas argentinas são bem diferentes das brasileiras. Nossas abelhas são africanizadas e muito mais agressivas, não se poderia fazer com elas o que ele estava fazendo. Explicou que na Argentina as abelhas só mordem quando estressadas por ruídos ou amedrontadas por gestos bruscos. Enquanto nos explicava isso, uma abelha se alimentava em seu dedo.
Eu estava encantada com o espetáculo e ouvia com meia atenção o Rossano, meu marido, dizer: “tem uma abelha na minha orelha”. O Sr. Juricich disse: “não te mexe, não a assuste e ela vai embora”. “Acho que ela está me mordendo”. Com um sorriso, o Sr. Juricich disse: “Impossível!” Ao se aproximar, admirou-se: ela realmente tinha ferroado a orelha indefesa.
Nunca fui vítima de abelha, marimbondo, nada assim, talvez por sorte, talvez por tentar não me aproximar muito… mas o Rossano sofreu. Pode ser que as abelhas argentinas sejam menos agressivas que suas parentes brasileiras, mas o mesmo não acontece com seu veneno. A orelha dele inchou, ficou quente e vermelha, e doeu por cerca de dez dias. Doía a ponto de, quando o Rossano estava dormindo e se virava para aquele lado, a dor o acordar.
Seis meses depois, estamos em Bombinhas, num dia perfeito para caminhada. Quem conhece essa charmosa praia sabe que com a maré cheia fica muito estreito para caminhar. Aquela manhã a maré estava recuada e uma larga extensão de areia plana se estendia a nossos pés.
No meio da caminhada ele parou com uma exclamação e puxou o pé: “alguma coisa me mordeu”. Tentou continuar a caminhar comigo, mas doía muito. “Seja o que for que me pegou, deixou alguma coisa aqui”. Conseguiu remover um ferrão mínimo. “Está doendo, queimando. Parece até quando a abelha me ferroou”.
Com ele mancando, começamos a voltar. Eu estava preocupada, perguntei se não teríamos que procurar ajuda médica, já que não sabíamos o que tinha havido.
“Foi abelha. Conheço esta dor”. Eu duvidava. Abelha na areia da praia?
Então vi o cadáver da culpada. Uma única abelhinha, morta, de barriga pra cima.
E teve que achar o pé da pobre vítima!